BRUNO FERRARI E DANILO VENTICINQUE
Neste ano, os candidatos festejaram a conquista de uma nova vitrine para fazer propaganda política: a internet. Todos apostam na rede como um poderoso meio para interagir com os eleitores, medir em tempo real a reação da opinião pública, debater com os adversários e, no limite, estabelecer a agenda da eleição. Dois fatores ampliaram a relevância da campanha on-line. O primeiro – e mais óbvio – é o crescimento do número de internautas no país. De acordo com o Ibope, o Brasil saltou de 32 milhões de pessoas com acesso à internet nas eleições de 2006 para mais de 66 milhões hoje.
O segundo fator é a nova legislação eleitoral sobre o assunto. Ela dá aos partidos uma liberdade inédita na rede. Ao contrário dos anos anteriores, quando a internet estava sujeita às mesmas restrições aplicadas à TV e ao rádio, neste ano é possível organizar debates livremente, mesmo sem a participação de todos os candidatos, usar redes sociais mesmo antes do período oficial de campanha e fazer da internet um campo de provas para todo tipo de ideia exótica na batalha eleitoral.
Para tentar transformar essa esperança em realidade, os três principais candidatos à sucessão de Lula armaram estratégias digitais distintas. Até agora, o PT foi o partido que mais investiu na campanha on-line. Seu principal objetivo é estimular os militantes a criar e disseminar conteúdo favorável à candidata. Para isso, será usado um software para cadastrar e classificar militantes com uma espécie de ranking. O internauta ganhará pontos de acordo com a qualidade e a frequência de suas colaborações. Os voluntários mais prolíficos serão convidados a reuniões exclusivas e receberão conteúdos especiais, como ocorreu na campanha de Obama. Os petistas contam com a consultoria de três profissionais que estiveram envolvidos nela.
No PSDB, o próprio candidato, José Serra, é um usuário frequente da internet e das redes sociais. Atualizado pelo próprio Serra, seu perfil no Twitter conta com mais de 209 mil seguidores (o maior número entre os políticos brasileiros) e é usado quase exclusivamente para assuntos leves, como futebol, música ou cinema. A iniciativa é vista no partido como uma eficiente maneira de humanizar a imagem de um candidato tido como sério e fechado demais.
Outro objetivo da campanha tucana na rede, de acordo com um de seus estrategistas, é tentar influenciar a imprensa. Para isso, além do Twitter de Serra, o PSDB conta com três sites para reunir militantes e divulgar críticas aos adversários. Um deles, o mobilizapsdb.org.br, incentiva os internautas a espalhar um quadro com uma comparação entre os candidatos. O quadro define Dilma como uma menina rica, frequentadora de “escolas burguesas”, que “ingressou em grupos armados responsáveis por assaltos, sequestros e assassinatos”. O perfil de Serra o define como um rapaz estudioso, filho de imigrantes, que ingressou na política pelas eleições.
Na campanha de Marina Silva (PV), a internet se tornou uma prioridade quase natural, pois Marina tem pouco tempo no horário eleitoral gratuito em comparação com seus adversários. Sua estratégia é usar o programa na TV para divulgar seus sites e criar interação por meio de remissões a textos publicados em seu blog. Outra meta é usar a internet para arrecadar doações de cidadãos. O PV é o primeiro partido brasileiro a implantar esse sistema, semelhante ao usado na campanha de Obama. Representantes da sigla dizem que, até o fim de março, o partido recebera R$ 203 mil em doações feitas por 91 pessoas.
A euforia em relação à campanha de Obama fez com que o PT contratasse Ben Self, ex-diretor de tecnologia do Partido Democrata e hoje dono de uma agência especializada em marketing político na internet. No ano passado, Self participou de eventos de política e marketing digital no Brasil. Era tratado como herói, sempre lembrado pelos números gordos da campanha on-line democrata: mais de 13 milhões de e-mails de eleitores cadastrados, uma rede de 3 milhões de doadores e a arrecadação recorde. Mas há tanta disparidade entre Brasil e Estados Unidos que fica difícil acreditar na “obamização” de nossos candidatos. A começar pelo alcance da internet. Nos Estados Unidos, ela atinge 76% da população. No Brasil, 34%. Há motivo para ceticismo até entre os marqueteiros digitais. “A internet não ganhou a eleição para o Obama. Quem ganhou foi o Obama”, diz Sérgio Caruso, coordenador de comunicação digital do PSDB. “A internet só ajudou a espalhar e a explicar suas propostas.”
Os petistas, que contrataram Self, demonstram uma fé maior nos poderes digitais. “A dinâmica da internet é diferente do rádio e da TV. É impossível fazer uma campanha centralizada na internet”, afirma Marcelo Branco, coordenador da campanha on-line de Dilma. Na semana passada, porém, o próprio Branco protagonizou um episódio que revela alguns limites nessa dinâmica da rede. De forma equivocada, ele protestou em seu Twitter contra a campanha elaborada para comemorar os 45 anos da Rede Globo (pertencente ao mesmo grupo de mídia que publica ÉPOCA). Branco afirmou que ela lembrava o mote de campanha de Serra, O Brasil pode mais. A Globo preparava a campanha desde novembro de 2009, quando ainda não havia candidatos – muito menos slogans. Mesmo assim, a emissora optou por suspender a campanha para evitar insinuações.
Os próprios partidos acabam sendo vítimas desse ambiente. Seus sites oferecem diversas brechas a criminosos, que usam o anonimato da rede para invadi-los e derrubá-los. Uma onda recente de ataques atingiu sites oficiais de três dos principais partidos brasileiros. O primeiro a sofrer uma invasão foi o do PT, no dia 12 de abril. Na semana passada, os sites do PSDB e do PMDB também foram atacados. “Muita gente sabe explorar essas brechas porque as falhas mais comuns estão abertamente divulgadas em blogs, fóruns e sites especializados”, diz um hacker brasileiro.
Outro fator que limita o uso elei-toral da internet no Brasil é a obrigatoriedade do voto. A rede, por sua natureza, depende da iniciativa dos usuários. As informações sobre política na internet são acessadas apenas por aqueles que se interessam pelo assunto. “Para a maioria dos eleitores, que se sente obrigada a votar, esse interesse espontâneo por política não existe”, afirma a cientista política Alessandra Aldé, pesquisadora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Nos Estados Unidos, essa parcela desinteressada da população não influencia o resultado, pois tende a se abster nas eleições. No Brasil, graças ao voto obrigatório, é menor o peso dos eleitores mais engajados no resultado das eleições.Não é à toa, portanto, que a maior aposta de todos os partidos para a campanha continue sendo mesmo o horário eleitoral gratuito no rádio e na TV. Em vez dos 34% de penetração da internet, a TV está presente em 97% dos domicílios brasileiros – atinge, portanto, quase todos os eleitores. “Ainda vai levar um bom tempo para a internet começar a ter um alcance parecido com esse”, diz Antônio Graeff, fundador de uma agência digital e autor do livroEleições 2.0, sobre o uso da rede para campanha. A pesquisadora Alessandra, da Uerj, tem opinião parecida: “Em termos de impacto direto, a força da internet ainda é muito menor que a do horário eleitoral”. “Para a maioria dos eleitores, a política só começa quando a campanha chega à televisão.”
Fonte: www.revistaepoca.globo.com
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